hoje com o meu pequenino

hoje trouxeste-me um bálsamo sagrado escondido na algibeira
trouxeste contigo o doce quente de permanentes verões
deixei-me levar assim que coseste aos meus os teus olhos feitos botões de luz
e o dia durou anos de festa com janelas escancaradas em direcção ao sol
relembraste-me o festejo da vida
então fiz-me pequenina para acompanhar os teus passos
e continuei até que não houvesse mais folegos de gargalhar
mas é sempre assim quando estas aqui meu tesouro


Apenas se vê bem com o coração.

O essencial é invisível aos olhos.


.in "O Principezinho"

de Antoine de Saint-Exupéry

Porque é hora de sophia

Hora

Sinto que hoje novamente embarco
Para as grandes aventuras,
Passam no ar palavras obscuras
E o meu desejo canta --- por isso marco
Nos meus sentidos a imagem desta hora.

Sonoro e profundo
Aquele mundo
Que eu sonhara e perdera
Espera
O peso dos meus gestos.

E dormem mil gestos nos meus dedos.

Desligadas dos círculos funestos
Das mentiras alheias,
Finalmente solitárias,
As minhas mãos estão cheias
De expectativa e de segredos
Como os negros arvoredos
Que baloiçam na noite murmurando.

Ao longe por mim oiço chamando
A voz das coisas que eu sei amar.

E de novo caminho para o mar.

Sophia de Mello Breyner Andresen

deixar correr o marfim

de novo o tapete verde estendido na sala
a tentar prender todas as atenções

e desta não foi propriamente, mais uma forma certeira
de deixar correr o marfim
esta foi amplamente, e a meu ver
a contragosto de muitos,que a faziam ligeira,
uma empresa de longe, carregada de emoções

enquanto algo maior acontecia,
lá ao cimo no mayombe
mais abaixo e numa outra dimensão,
algo de novo se fazia anunciar,
agora já com uma outra intenção
a perder enfim a atenção
de jogadores(de bancada)decerto mais distraidos

de novo o tapete verde estendido na sala
algo novo em travo amargo, desnunado de direito,
contrafeito, a contragosto e a descompasso
de novas eras de mudança
vestidas com frescas matizes de esperança

desta feita certamente, e sem grande inspiração
na contradição, revolução, constituição
vão encarnar o fado negro e deixar correr o marfim

que gana!

hoje há jogo.
eu sei.
e não vai ver?
ia-lhe explicar mesmo que desconsegui depois daquele dá e leva, e nem mesmo depois do empate reclamado pelo mali...
e a mãe sabe que jogo é que é?...
e aí fui fui logo na defesa e tal, que era quartos de final e que estava tudo nos blogs e tal que mais, até davam as notícias frescas, com ar de quem está mesmo por dentro dos assuntos.
até estava mesmo. nos assuntos da nossa lavra temos mesmo que estar atentos...
depois ía espreitando o longo caminho de tempo interminável que não abria espaço para entrar o nosso um.
e não entrou. a cada não!!! do ainda não foi este, até aquele desviado no último segundo que me levou de novo à escuta, terminamos.
filho fomos roubados?
não mãe... jogaram bem.
nem há descontos nem nada, nem prolongamentos...
não mãe já acabou.
que gana!

desculpa, mas não consigo aprender a tua força

sabes o que mais me custa?
não conseguir ter-te nos meus braços
não poder o impossível de te trocar no espaço.
aquele que existe entre ti e mim
o que faz de ti primeira e que fez de mim gente
custa-me não poder embalar-te, mimar-te e dar-te colo
então, resta-me aninhar-me e fazer-me pequenina
enroscada às tuas raízes
afinal é assim que fico realmente diante da tua grandeza.
acreditas que enquanto a ciencia procura em contra relógio
atalhos de retrocessos do caminho
para recolorir mais um dia que te pertence
enquanto se te descola a pele das tuas entranhas
eu procurava nos devaneios de escape da dor
um nome de uma árvore que te acentasse bem, acreditas?
a mulemba pereceu-me a eleita embora a acácia rubra
também estivesse neste rol de absurdos insanos.
nos intrevalos em que o teu corpo faz com que pensem que dormitas
embora estejas só a recuperar para mais um folego de estrada,
olho-te bebendo-te sofregamente os momentos presentes
e penso que não posso encontrar o nome da tua árvore
ou da árvore que serias tu, simplesmente porque és aquela
que um dia dará o nome à árvore, ao ser, ao corpo
que de alguma forma se possa assemelhar a ti.
és única mãe.
desculpa, mas não consigo aprender a tua força.
fica comigo mãe, está tudo escuro.

ouvi dizer...

ouvi dizer,
"é o mambo que estamos com ele...
palancas até ao fim"
agora é só levantar a cabeça
e embora a sério quisesse dizer
não substimes o inimigo
só que me apetece sempre brincar com estas dores
e dizer que bom anfitrião
sabe dar e receber,
literalmente
vamos lá dar a volta a isto

yes we CAN

ageitei-me bem no banco para tentar ficar um pouco mais confortável.
afinal, a viagem tem que continuar, entre emoções.
é a única maneira de traduzir com sentimento e elegância os solavancos como lhe chamaria a mãe.
tento ver o que me está a incomodar mas a almofada até é de sumauma e nem sei porque me queixo. se calhar é daquela que está por baixo e que não dá para perceber logo, e que ainda é de palha. embora bem remexida para ficar mesmo fofa bor baixo do riscado camões que lhe dá forma, prega-nos sempre partidas com dores nos viongos.
há-de haver sempre um toro na palha de milho a incomodar.
desde ontem que me acompanha esta tristeza, com um misto de frustração. porque teríamos que merecer isto? porque teria de acontecer. fui-me tentando manter informada e ouvir opiniões. consternação é a palavra que pode traduzir o estado de espírito dos que me acompanham. andei desde o morro da maianga até à kianda, à bela, ouvi todos os mujimos.
feriram-te mãe terra no coração do mayombe.
é assim mesmo entre emoções. da euforia à tristeza. não podemos dosear. há mesmo que acelerar nas rectas e abrandar nas curvas, mas temos que continuar a viagem.

o meu cajado | das cantigas de escárnio e maldizer

se o símbolo do meu poder
estiver no meu cajado
então este será o prolongamento do meu braço
irei pois morrer com ele
ninguém o tomará de mim

para o defender
tomarei o teu castelo
percorrerei montes e vales
desvastarei e arrasarei quem se atravessar no caminho
em nome de um deus desconhecido
que desflorou donzelas
reprimiu irmãos,fez escravos, conduziu soldados
dizimou nações
e não protegeu os seus filhos
mas que orgulhosamente defendeu a instituição sagrada

para ser perfeito
vou chamar-lhe um nome
que honrarei e defenderei a todo o preço
à dignidade e o direito de o usar exigirei zelo
não o deixarei em mãos alheias

direitos fundamentais com a mayer

ontem derrubei um muro
cheguei à conclusão que era apenas de areia
era feito de PRECONCEITO.
depois de vários revés
munir-me de armas e ferramentas para fazer face à situação
peguei num pequeno instrumento que era feito de DIREITO.
fiquei então confudida senão mesmo comigo desapontada,
se os meus altos valores não me traíam
deveria ser o primeiro, senão o único que deveria ter usado.
com muitas explicações introspecções, acatos e desacatos
à volta daquela questão,
cheguei à simples conclusão que todas elas andavam
em torno de um (turbilhão)palavrão, a que chamamos CONCEITO.
Então todo o ruído, toda a diversão andava à volta do conceito
foi afinal tão simples... tão claro... e esclarecedor...
ontem aprendi a lição apenas de uma diferença, entre uma questão de direito e uma questão de conceito e que fazem a sentença.

Quero-te por ao colo querida

Quero-te por ao colo querida,
continuar a embalar-te nos braços
afagar a carícia dos teus caracóis enleados
de ondas de venturas e vitórias
com matizes de desassossegos e desesperanças
que repousam e se enlaçam nos contornos do meu seio
e acordam no meu espaço da alma ainda enferma
Asseguro-te que estarás segura
poderás balançar-te, jogar sortes à sorte
calcorrear caminhos quase de olhos fechados,
asseguro-te que estarás segura.
Mas quando te dou o espaço da tua altura
a que tenho na mente não corresponde à tua medida
medes-te muito acima da que tenho ao colo
assim não podes caber mais e eu não me conformo
porque te sinto leve no espaço da minha alma.
Quero-te por ao colo querida,
mas tenho que te deixar seguir.

o verde é sorriso porque é feito de sol e de mar

o verde é sorriso porque é feito de sol e de mar
de cores combinadas de luz e odores
o verde é sorriso porque a esperança o abraça
e se ata ao desejo vestida com cores de luares
porque os luares sabem a paixão
e a paixão nos devolve e envolve na esperança
de volta aos lugares de sonhos de cinzas azuis feito verdes
fundidas no desejo da fluidez quente de sois
assim me vejo de paleta em riste
contorcer e combinar as formas e vontades minhas
aperfeiçoar a arte de esculpir caminhos
e em estradas de cores ouço murmúrios de verdes
que lentamente sobem ao tom de baladas de sol e de mar
que compus para mim enquanto espero
o verde é sorriso porque é feito de sol e de mar

desabafo

agora percebi a clausura
e desatei a escrita
ficou tudo mais claro
no verdadeiro sentido.
dou por mim às vezes no escuro
num emaranhado de teias
e tenho medo
tenho medo quando me falta a escrita
quando a mente escurece e fica em branco
eu sei
sei que o escuro branco me assusta
castra, trai e tolhe
então procuro seguir a luz
pisar as brasas do caminho e seguir
vou subir as mãos vazias
não as deixarei cair

hoje com sofia, Poema

Poema

A minha vida é o mar o Abril a rua
O meu interior é uma atenção voltada para fora
O meu viver escuta
A frase que de coisa em coisa silabada
Grava no espaço e no tempo a sua escrita

Não trago Deus em mim mas no mundo o procuro
Sabendo que o real o mostrará

Não tenho explicações
Olho e confronto
E por método é nu meu pensamento

A terra o sol o vento o mar
São a minha biografia e são meu rosto

Por isso não me peçam cartão de identidade
Pois nenhum outro senão o mundo tenho
Não me peçam opiniões nem entrevistas
Não me perguntem datas nem moradas
De tudo quanto vejo me acrescento

E a hora da minha morte aflora lentamente
Cada dia preparada

Sophia de Mello Breyner Andresen